quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A engenharia da boa música




Imaginem um polvo. Agora imaginem que o polvo toca um instrumento em cada um dos seus oito braços. Agora esqueçam essa imagem, porque nem os oito braços do polvo seriam suficientes para tocar os 14 instrumentos presentes em cada concerto de Noiserv – o alter-ego de David Santos, a quem chamam “o homem-orquestra”.

Licenciou-se em Engenharia Electrotécnica e de Computadores, no Instituto Superior Técnico, em Lisboa, porque “era muito bom a Matemática e a Física, no liceu”. Trabalhou durante dois anos na Siemens e quando lhe propuseram entrar para os quadros da empresa pediu a demissão. Desde 2005 que se dedica, para nossa sorte, em exclusivo à música, nomeadamente ao projecto indie Noiserv. Hoje, a realidade não é a que imaginava enquanto criança, apesar de haver pequenos indícios das ruas por onde a sua vida teria obrigatoriamente que passar. “Queria ser bombeiro, depois queria ser veterinário, queria ser uma série de coisas. Mas os meus pais dizem-me que eu lhes pedia para gravar os videoclipes de música e eu ficava horas e horas a ver as cassetes.” Afinal, as coisas boas devem ser partilhadas e o talento deste lisboeta de 31 anos é grande demais para ficar confinado a um gabinete. 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Uma coragem que não conhece fronteiras



Mónica Pacheco @ Guiné

Tudo começou com uma epifania aos 16 anos, quando percebeu que a vida só faz sentido“na relação e entrega aos outros”. Desde então, Mónica Pacheco não tem parado. A sua missão de voluntariado passou por Angola e Moçambique e hoje está a trabalhar na Guiné-Bissau, como Técnica Formadora em Gestão e Administração Escolar. Viver para e pelos outros só faz sentido quando o coração é tão grande que quase não nos cabe dentro do peito.

Enquanto Portugal vibrava com a realização do Europeu de Futebol em 2004, Mónica Pacheco partia para a primeira aventura internacional, em Luanda, através do grupo GAS’África, naquela que seria uma viagem para nunca mais voltar. Regressou, fisicamente, mas a essência e a paixão desta gaiense ficaram em África, para onde voltou ano após ano, dando sempre um pouco mais de si àqueles que pouco ou nada têm. A missão em Luanda foi como um despertador numa alma que transborda sorrisos, emoção e bondade. Se antes Momi, como é carinhosamente chamada, quase desmaiava com uma simples ferida, naquela altura aprendeu a ultrapassar os medos, pois viu “as piores coisas do mundo”, mas não continha as lágrimas nos momentos de confrontação com a realidade em que estava. De manhã trabalhava no Hospital Central de Luanda, à tarde num centro de acolhimento de crianças, onde conheceu “meninos sobreviventes e lutadores, rendidos à surpresa de serem amados.” E “era feliz naquela entrega, em tudo que fazia e aprendia naqueles dois meses de missão; vinha sempre com o meu mundo maior, com o coração mais dorido, os olhos molhados, mas um contentamento que as palavras ainda não conheciam - e não conhecem.” Confessa que “nunca mais amei nem me entreguei de forma tão autêntica, tão genuína, tão inteira como na minha primeira missão em Luanda. Tinha 20 anos, saída de uma família que me protegia e mimava, consciente dos problemas do mundo, mas longe de os viver e experimentar.” E não foi fácil convencer a família protectora de que a vocação e o chamamento tinham que ser respeitados, mas o receio de que Mónica nunca mais fosse feliz trouxe o apoio que tanto precisava, principalmente quando voltava das missões. Trocou a licenciatura em Sociologia por Serviço Social, “uma aprendizagem muito mais significativa, construtiva” pois o seu objectivo “era trabalhar com as pessoas”. 

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Há lugares que nos recebem de braços abertos


Diana Vaz Ribeiro - fundadora da Marabô

Alguns locais têm vida própria, como se lhe sentíssemos o pulso e o bater do coração. A Marabô – Formações & Eventos Culturais é um desses espaços e foi criado por Diana Vaz Ribeiro. Aqui reúnem-se diversas e complementares actividades - tudo para que possamos reencontrar o nosso “eu” perdido.

O ser humano é insatisfeito por natureza. Queremos mais, melhor e, de preferência, já! E com isso acumulamos tarefas, responsabilidades, prazos, aos quais até podemos dar resposta, mas que vão deixando as suas marcas, nesta busca incansável pela perfeição do imperfeito. Quando damos por nós, não nos lembramos onde deixamos a chave do carro, o dia é um drama se o telemóvel ficou em casa e haverá problema na certa se alguém se esquece do aniversário de casamento. Diana Vaz Ribeiro, licenciada em Psicologia, desde cedo percebeu que esta área “pode não ser a única solução. E a arte, a expressão dramática, a meditação ajudam” para os problemas do quotidiano. Por isso, criou a Marabô, onde encontramos várias ofertas de formação, eventos, consultas e dinâmicas na área da Psicologia e actividades lúdicas. Assim, em Agosto de 2012 começou a ser projectado aquele que se revelou como um dos grandes desafios desta portuense de sorriso rasgado: “desde que saí da faculdade que queria abrir o meu espaço, mas tinha medo do futuro. Depois de passar por determinadas experiências, percebi que o medo do futuro é exactamente igual, quer esteja empregada ou por conta própria.” O local escolhido não poderia ser melhor: um edifício antigo, cheio de história nas paredes, nos degraus, em plena cidade no Porto, junto ao Pavilhão Rosa Mota.
 

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O dom de comunicar através das imagens



Eloquência dos Olhos - Enough is Enough (No More Tears)

Nunca foi tão fácil e acessível preservar momentos para a posteridade. A era digital trouxe a massificação das máquinas fotográficas e criou a ideia de que cada um de nós é um pequeno especialista na matéria. Mas Igor Martins não vai em ideias nem em palavras: “sou mais de imagem do que palavras. As palavras às vezes começam a faltar”, por isso, é através das representações da realidade que ele comunica. Este jovem e tímido estudante de fotografia viu um trabalho de curso, “Eloquência dos Olhos”, ser referenciado num prestigiado órgão de comunicação nacional e tem dado nas vistas pela humanidade e sentimento com que fotografa.

Não passa um dia sem que vejamos alguém de câmara em riste, seja por motivos profissionais ou por lazer. Na verdade, a fotografia, “técnica de criação de imagens por exposição luminosa”, preenche-nos os dias, mas nem todos têm aquela capacidade de transformar uma imagem num momento, numa memória, como o Igor tem. Neste trabalho mais conhecido, a “Eloquência dos Olhos”, realizado no âmbito do projecto final do primeiro ano do curso de Fotografia, do Instituto Português de Fotografia, este portuense abandonou a sua zona de conforto, porque "o retrato nunca foi a minha praia. Então pensei: ou vou ser o que fui sempre durante o curso - que era mais virado para os pormenores dos objectos corriqueiros, ou vou fazer diferente. Então, decidi arriscar no retrato e a preto e branco. Pensei que deveria perder o medo à abordagem na rua." A namorada auxiliou-o neste processo de convidar desconhecidos para serem fotografados, permitindo ao Igor focar-se no que sabe fazer de melhor: a captura da essência de um rosto humano. "O facto de teres várias pessoas iguais, no mesmo enquadramento, faz com que olhes sempre para a pessoa de forma comparativa, como se fosse uma caderneta de cromos. Ao comparar, reparas que os olhos são quase todos idênticos, mas as feições mudam. Mas na rua não olhas para estes traços. Se estiveres atento é que vês que há olhares mais tristes ou mais contentes. E eu queria destacar as marcas das pessoas, as cicatrizes das pessoas, que se vê, principalmente, nas mais velhas."