Elas também
contam histórias. Abordam as pessoas na rua e ouvem-nas. Conversam com elas até
que venha ao de cima aquele pormenor, aquele acontecimento marcante e
distintivo. E depois fotografam. Conseguindo quase captar a essência de cada
um. Como se a imagem fosse a radiografia da pessoa. A Catarina, a Daniela e a
Erge criaram o Humans of Porto para puxar “o que de mais interessante há em
cada um”, tendo a Invicta como cenário.
O projecto é uma adaptação do bem-sucedido e
reconhecido Humans of New York, mas
adapta-se às especificidades do Porto e das suas pessoas. A história tanto pode
ser sobre o turista, como sobre a vendedora de flores no Mercado do Bolhão. O
que importa “é aquilo que as pessoas nos transmitem. No início foi um pouco à
sorte, depois percebemos que tipo de abordagem resultava melhor. É um processo
de aprendizagem que ainda está a acontecer”, afirma Catarina Costa,
especialista em videografia. Olham para alguém e têm um palpite “aquela
rapariga deve ter alguma coisa para nos contar e vamos e começamos a puxar
conversa”, completa Daniela Espírito Santo, jornalista. A completar a equipa, a
fotógrafa Erge Sonn, natural da Estónia e estudante de Erasmus, aceitou logo o
convite para integrar o Humans of Porto,
quando conheceu o projecto homólogo da cidade que nunca dorme. Complementam-se
no talento e na paixão pela história e por aquilo que cada rosto parece contar.
Encontraram-se duas vezes e estava decidido: o Humans of tinha que existir no Porto. A
página do Facebook foi lançada oficialmente a 1 de Dezembro de 2013, numa
altura em já tinham várias histórias publicadas, o que lhes permitiu apresentar
desde logo algum trabalho feito. Aos poucos vão ganhando reconhecimento – até
já foram abordadas na rua por alguns fãs, mas ainda se deparam com alguns
entravas, principalmente das pessoas mais velhas, como conta a Daniela: “No
início, alguns não percebem o que estamos a fazer. Pensam que estamos a tentar
vender alguma coisa. Outras pessoas adoram o projecto, mas quando dizemos que é
para publicar não querem, porque ainda há um estigma em torno do Facebook,
especialmente com as pessoas mais velhas. E depois há aqueles desconfiados
sobre o que fazemos, mas depois tornam-se alguns dos nossos maiores fãs e fazem
gosto em todas as fotos e mandam mensagens.”
As três participam no projecto de forma
“democrática”, escolhem as pessoas juntas, editam os textos em conjunto, de
modo a que todas estejam envolvidas. Contudo, e apesar de habitualmente saírem
as três juntas à caça de histórias, não perdem uma oportunidade quando a
história vai ter com elas – afinal é nos acasos da vida que se encontram
algumas das maiores surpresas. Garantem que abordam “muita gente e tentámos não
sair da beira da pessoa enquanto acharmos que ela tem alguma coisa para nos
contar, que tem algo para partilhar connosco.” A Daniela afirma que têm
consciência da dificuldade que é em apenas alguns minutos de conversa conhecer
bem as pessoas, por isso, tentam puxar sempre pela “história mais genuína e que
nos diga quem a pessoa realmente é. E fazemos isso no texto e na fotografia. E
a maior parte dos elogios que recebemos passam por aí, porque as pessoas dizem isto sou mesmo eu, eu rio-me assim. É
tão difícil fotografar estranhos e mostrar quem eles são. Mas é isso que nos dá
gozo.” Um gozo especial por acontecer na cidade do Porto, uma cidade
“inspiradora e com contrastes muito interessantes”, de acordo com a Catarina. A
paixão pela Invicta é partilhada pela Erge que não fala português, mas percebe
a maioria das conversas. Aliás, a estudante apaixonou-se de tal forma pela
cidade que gostaria de regressar um dia, sem bilhete de volta para a Estónia:
“acho que as pessoas são mais abertas, é mais fácil conversar com elas. São
amigáveis, genuínas e honestas.” Questionei-a se pensa em criar o Humans of Estonia ao que me respondeu
que não, porque “os estonianos são mais desconfiados e perguntariam por que é que que estás a falar comigo?”
Há quem deixe uma mensagem para o mundo, há quem
recorde pormenores da juventude que julgavam esquecidos, outros param um pouco
para pensar em quem são e para onde querem ir. Mais que um retrato textual e
visual das pessoas, as três jovens potenciam uma espécie de reencontro connosco
próprios.
As histórias
mais marcantes
Foto: Erge Sonn |
Daniela
“A minha história
preferida aconteceu por acaso. Não foi algo que nós procurámos. Fui estacionar
o carro e dei por mim a falar com um arrumador, sem-abrigo, que nos contou uma
história inacreditável e que, para mim, é sem dúvida umas das mais marcantes do
Humans. Marcou-me porque não estava à espera. Tens alguma expectativa em
relação a determinada pessoa por causa dos estereótipos e depois, porque ele
foi tão bem educado, tão bem falante. E a história dele revoltou-me e
apetecia-me mudar-lhe a vida. E é por histórias como esta, que merecem ser
contadas, que criámos esta página.”
Foto: Erge Sonn |
Catarina
“A minha preferida é a
de uma senhora que estava à janela e quando começámos a falar com ela
perguntei-lhe como tinha sido o seu primeiro beijo. Ela ficou tão corada, que
parecia que estava a ver uma criança a reviver o passado. Ela não conseguia
dizer como foi. Só apontava para a cara foi
aqui e aqui.”
Foto: Erge Sonn |
Erge:
“Gosto das histórias mais
estranhas, como a do homem que cozinhava peixe na rua. E eu a pensar, como é
que que aquilo era possível, com os carros a passar… Mas ele era feliz com
aquilo. E para ele é normal. Eu gosto dos detalhes. É interessante ver as
diferenças culturais.”
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